Caligrapixo é o nome que o pixador Kamikaze (KMKZ) encontrou para nomear a si mesmo. Nascido em 1989, em São Paulo, é onde vive e trabalha. Vale a pena lembrar que a caligrafia, o exercício da escrita bela, vem dos radicais gregos kallos, que significa belo, e grapheîn, escrever. Quase todas as civilizações com escrita praticaram a caligrafia com variações, tanto no Ocidente quanto no Oriente. Aprender caligrafia — que foi a base da formação do pintor na Ásia — parece aproximar-se bastante daquilo que os jovens fazem hoje ao investirem nos muros das cidades.
Caligrapixo desenha seus poemas místicos sem associar temas específicos. Ele nos apresenta a repetição da sua escrita e seus estados internos, que são traduzidos em uma inundação de sensações e no esquecimento de si mesmo em uma presença misteriosa. Essas escritas são muitas vezes um símbolo forte de unificação ou, ainda mais, de distinção. Elas podem ser simples pseudo-caligrafias ilegíveis, mas marcam uma identidade ou se aproximam de uma dimensão quase espiritual. Ele faz de tudo para que não consigamos nem ler, nem entender sua caligrafia — que torna-se, assim, de forma gradual, uma pintura cada vez mais abstrata. De acordo com o artista, encontramos tudo isso em suas intervenções em espaços públicos. Ele quer quase desaparecer, ter um trabalho camaleão. Cabe ao espectador encontrar e imaginar.
A "PIXAÇÃO", escrita assim mesmo com "X" ou na forma abreviada como "PIXO", é um movimento de intervenção urbana que surgiu no começo dos anos 1980 em São Paulo. Nasceu de forma natural, sem influência de nenhuma outra cultura de rua do resto do mundo, e se destaca por sua caligrafia única. Enquanto o mundo inteiro foi influenciado pelo graffiti de Nova York, com suas letras arredondadas, aqui, as letras dos pixadores tornaram-se cada vez mais retas, para acompanhar — de certa forma — a arquitetura da cidade de São Paulo, com uma paisagem cheia de prédios. Essas letras são conhecidas no resto do mundo também como tag reto. Apesar de ser um movimento underground, os pixadores são muito bem organizados. Existem encontros semanais, festas e até mesmo protestos organizados por eles. A pixação é feita por jovens e adultos que nunca pararam de escrever seus nomes. Cada um tem sua motivação pessoal para repetir esse nome pela cidade — uns como forma de protesto, outros como válvula de escape, por reconhecimento pelos demais, por satisfação pessoal, adrenalina.
A pixação também se destaca pelo modo como o pixador ocupa a cidade em todas as suas possibilidades: em muros, fachadas, topos de prédios, em cima de janelas, escalando por fora dos edifícios e arriscando suas vidas para colocar seu nome na rua. Pixadores atuam sozinhos, em grupos, de dia ou de noite, com spray, com tinta e rolinho. A escolha do lugar pode ser planejada ou acontecer no impulso do momento. Alguns pixam monumentos, igrejas, escolas, cemitérios e hospitais. Não há nada que os impeça. Existe uma liberdade muito grande dentro da pixação. Não existem regras — a única regra é o respeito: ninguém pode escrever seu nome sobre o nome de outro.
Nos últimos anos, a tipografia da pixação tem sofrido enorme apropriação por tipógrafos, publicitários e artistas. Quem se apropria dessa caligrafia enxerga nela um grande potencial estético e visual. Ao falar sobre suas obras, Caligrapixo afirma que seu trabalho é uma representação artística da caligrafia urbana — especificamente da caligrafia da pixação — e que ele realiza esse tipo de trabalho desde 2011. Participando do movimento desde 1996 com o nome de “KAMIKAZE”, ele conta que o trabalho nas ruas, como intervenção urbana, busca seguir ao máximo o padrão da arquitetura da cidade e se fundir à sua paisagem. Através de um estudo e pesquisa profunda da tipografia da pixação paulistana, Caligrapixo desenvolveu quatro alfabetos distintos. São totalmente diferentes do que se vê nas ruas, pois são muito estilizados, mas mantêm a essência da tipografia da pixação.
Embora pertença ao universo das ruas paulistanas, Caligrapixo também tem o desejo de dedicar parte do seu trabalho a uma reflexão artística que desenvolve no silêncio de seu estúdio. No Rosewood São Paulo, o artista apresenta suas últimas pinturas, desta vez em telas de formatos menores. Ele queria sair dos muros, olhar para outras linguagens e contextos, mas sempre mantendo como base a caligrafia da pixação. As cores que utiliza — preto, cinza e branco — são também as principais cores da cidade de São Paulo. As obras expostas no Rosewood São Paulo demonstram como Caligrapixo, mesmo profundamente ligado ao universo das ruas e arredores de São Paulo, nunca hesitou em posicionar-se também como pintor.
Saiba mais: https://www.instagram.com/caligrapixo/